/* PRIVILÉGIOS DE SÍSIFO 反对 一 切 現代性に対して - 風想像力

PRIVILÉGIOS DE SÍSIFO 反对 一 切 現代性に対して - 風想像力

LES PRIVILÉGES DE SISYPHE - SISYPHUS'PRIVILEGES - LOS PRIVILÉGIOS DE SÍSIFO - 風想像力 CONTRA CONTRE AGAINST MODERNISM Gegen Modernität CONTRA LA MODERNITÁ E FALSO CAVIARE SAIAM DA AUTOESTRADA FLY WITH WHOMEVER YOU CAN SORTEZ DE LA QUEUE Contra Tudo : De la Musique Avant Toute Chose: le Retour de la Poèsie comme Seule Connaissance ou La Solitude Extréme du Dandy Ibérique - Ensaios de uma Altermodernidade すべてに対して

2019-05-25

O NOVO CELTA AZUL

nuvem nave novidade
não te afundaste na língua?
então não conheces nada

náufrago de cinco vogais
exploro agora a oitava
cor do arco-íris

voltei com o assobio celta
à frente do coração
infinidade! a explodir

nome de azul no barco
e o meu último átomo
também é azul

shiva de olhos azuis
quem me apunhalou?
não importa, Agora o vento

azul levantou-se
corre-me nas veias o sangue
de Portugal, o sangue da infinidade

sol aberto na cabeça
dentro do cérebro sol azul
a voz verde de Viriato

saí do sarcasmo latino
e do teorema grego
corpo azul de celta

luz brilhante da pele
se tudo não me cinge de luz dourada
é porque não é verdadeiro

2014-02-20

A MÚSICA DENTRO DO NADA


qualquer voz nua autóctone tem mais de uma máscara
somos do país que viveu atrás das fontes
e evitou com todas as cautelas voltar a ouvir a voz do vento
agora chegam da montanha os uivos dos cisnes
mas tardias são todas as nossas asas e enxofradas
pela quezília fenícia sem fim que expulsou
os deuses gregos de cada praia

não vale a pena ouvires os aúgures da televisão
os críticos da economia e os homens de cara
apagada a borracha como os ministros vários
todo o calcário das ruas que é branco
tem hoje uma cor lívida

no entanto uma nuvem eleva-se
e tu és a mente que a envolve como um pássaro dentro
de uma gota de chuva

Teste

2012-11-24

APR.REALIZADORES.PORTUGAL: A TEMPESTADE de Teresa Garcia na Cinemateca de Bélgica - Bruxelas - 26.11.2012

APR.REALIZADORES.PORTUGAL: A TEMPESTADE de Teresa Garcia na Cinemateca de Bélgica - Bruxelas - 26.11.2012

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2011-01-15


este blog tem estado estático, mas ainda assim vem cá leitores e bastantes - obrigado pela vossa presença. Vamos recomeçar a pouco e pouco. Não faltam temas - o mundo está sempre a re-escrever-se - e não vai parar enquanto existir. Estava quase a falar das eleições - mas estou a captá-las na oblíqua - não vejo televisão há meses, nem quero. O mundo sem ser filtrado pela televisão apresenta muito mais vasta, melhor e vária realidade.

2010-08-26

O LIDL de SINES


Se alguma coisa pudesse simbolizar o pesadelo concentracionário, a tendência laboratorial, a redução da comida a cápsulas abstractas, o Aviário Humano ou melhor dito o Aviário Umano, essa coisa-caso, essa coisa caco lógico e racional, essa escola do intestino. essa norma do Peido Milimetrizado, é sem dúvida um Supermercado.

Seremos recordadøs como os infelizes cósmicos que compravam - e pior ainda se deliciavam - com super-mercados.

No abjectíssimo e recente caso do Supermercado LIDL aberto em Sines no tempo dos Cérebros-Completamente-Buraco registemos com tinta forte vermutizada com o camelo da dúvida que este ínclito supermercadomerece o Prémio Abjeccionista do Ano. O neo-pesadelo alimentar não poderia estar melhor milimetrado.

O triunfo do Enlatado! O triunfo dos Vinhos de Marca sem marca! O Triunfo dos Vinhos Sem Marca de Marca. A expulsão definitiva do talho! As mãozinhas salubres do Vegetariano de Lata!

Eu acho que o Xanax se encarnou em supermercado, neste caso muito mais do que em todos os outros. E se alguém entrar neste supermercado e sair de lá a sorrir é porque é dos nossos, um Abjeccionista. Um Inactivista. Em geral, sai-se de lá com a lata amolgada do cerebelo a chocalhar. Com a glândula pineal a ser vista num acto sexual infame com uma rolha de garrafa. Com as cápsulas supra-renais vendidas ao arménio das gravatas.


Se alguém quiser a definição do amorfo rectilíneo, da solução racional, da funesta lógica gestora, da ocupação "racional" do espaço" vá lá ver as mais tristes paralelas do planeta.

Se estiver a programar a sua família de abortinhos com-lugar-na sociedade, vá lá, gaste lá, gaste-se lá. Deixe a cada vez a sua espinal medula estendida como tapetinho. Agaredeça ao rato do seu computador estas ideias. Lamba-se com ziliões de caixas. À saída dê o seu salto quântico em direcção à perpendicular da bisscetriz que é a sua Espozita.
Faça coisas tintas com ela. Leve-a ao estado de frango. Que bom. Adoro a vida moderna. Tintemos no desalcoolismo!

2010-05-01

A Indústria Zen do Não Pensamento

assinalei a mim próprio o lugar no jardim:
a zona das caricas enferrujadas
fede? a cão, sim. a gato, a pirosfosfato
gostei de ver o arco-íris inválido
que veio chegando com a sua bengala
fosfática.

há coisas piores.
O O'Neill sem velhinha.
O Mick Jagger sem o dente de ouro -

o guarda, um Pião veio a rodopiar.
gostei de ver o guarda Pião. Coleccionei-o
com a severidade erótica de um Marquis de Sade
desordenando armações de óculos na Tudóptica.
(só pl'a rima, ma belle, só elle!)

afinal, beleza, era piona.
Dona de dois círculos imperfeitos e perfeitos.
Grande festa pelos malmequeres,
depois do moscatel e do pão de luar.

TERMINAL DO PORTO DE SINES EM EXPANSÃO





uma outra nova auto-estrada para acreditar na imbecilidade de outro parking,
um novo terminal no porto para crer na fé doutro petroleiro a entrar pela Ibéria
um novo centro comercial para se recusar ao centro íntimo e desviante que não vende nada

o país dos vendedores bombinha e o país dos devedores pírulas
um outro comboio para ligar dois cadernos de encargos a duas agendas políticas
mil e uma carruagens para conceber mil e uma noites com insónia e febre
ah mas felizmente as indústrias zelam, elas velam, não te deixarão morrer
tirar-te-ão cada angústia e cada prego, terás um pargo na boca a toda a hora
e o olhar limpo pelo Flúor! e é tão bom sondar o futuro com ossos de asfalto

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2010-03-23

Qui d'autre: Pèrec!

Depois de nos descrever que Fradique parecia "ter emergido , havia momentos, de quinzena preta e barbeado, do fundo vivo da Natureza", assim conclui Eça a apresentação de Fradique Mendes: "Só quando sorria ou quando olhava se surpeendiam imediatamente nele vinte séculos de literatura."

Não vou calcular quantos séculos atrás e sobretudo à frente se desprendem do olhar elétrico e magnético de Pèrec. Mas há homens que se tornam Sol, da cor que quiser imaginar.

2010-03-17

OS QUE TEM MEDO DA INTERNET





Photoshop

Photoshop

Photoshop


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2010-03-05

GREVE CEREBRAL PERPÉTUA




Como tornar uma greve interessante? Esta é que seria uma pergunta decisiva, porque na realidade as greves são exercícios do maior aborrecimento possível. Nem se está a trabalhar, nem se está ludicamente a não trabalhar, também não se está a "lutar", por mais que os dirigentes sindicais carreguem nessa tecla.
Umas quantas pessoas (os militantes) marcham, empunham uns cartazes, gritam uns slogans. Um dirigente ladra umas coisas. Os punhos erguem-se. Os rostos exprimem ressentimento. Somos vítimas de. E de. E de. Um trabalhador ressentido e irritado diz umas coisas. A televisão regista o momento. Mais tarde a Constança Cunha e Sá com ar perplexo comenta. Mas a maior parte das pessoas, dos grevistas, fica em casa a ver televisão.
Por mais upgrade que se lhes meta parece que as greves são como aqueles animais pré-históricos que ficaram cativos nos gelos siberianos. Não mexem, não mordem,não vão alterar nada - e vão ocupar espaço no lixo geral que são as televisões e os jornais.
E se por exemplo os grevistas, depois de se terem tornado maravilhosamente belos, viessem todos nus?
Talvez nos dessemos então conta que o nosso estimadíssimo e odiado país está em greve cerebral perpétua há vários séculos.


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2010-02-20

TU LOU, POÈME D'AMOUR

enquanto o espírito de Deus e o poeta
num grande ajuste de contas
se estrangulam num beijo a mais e errado
Deus canta por poetas tortos
e inscreve asas em penedos tontos

então as canções de abril
(todas mázinhas, valha-nos Deus)
vão mais uma vez beber xanax
à fonte, à única,
à Fonte Luminosa

e a maria da fonte de seios à vista
ergue de novo a espada e desafia
os cabrões, porque é de
mamas à vela
que se navega

e tu dizes revolução, pois sim
pois sim, mas Deus que afinal toma
partido não tem espírito nenhum
e o poeta está em greve
de marianas azuis

então volta o anjo da azia
e a terra geme sob o peso da
gente demasiado pura
eu que tenho esta sina
enganar-me sempre de rua

vejo-te como Ofélia que de repente
começou a andar de pé
sobre os poemas elisabetinos
menos conseguidos
e tudo passa como a

Casa Havaneza e as saudades
de um século que passou sem deixar nada
a não ser sangue, palavras
e preservativos
mas hás de voltar tu que nunca voltarás

tu Lou, poème d'amour
em tempo de psiconudismo

2010-02-08

MANIF


Privilégios de Sísifo convida-o a desfrutar das suas cordas vocais ao vivo e em boa companhia: qualquer opositor do novo fantoche lusitano, o Manipulador dos Bastidores, é bemvindo. Pode ir de gravata, de fato de ganga ou nu. Não importa. Leve-se a si mesmo e exerça um poder esquecido dos portugueses: o Poder de dizer não aos Irreais que julgam que nos governam e que apenas se governam a si mesmos. Não se dêem tréguas a esta gente de duas caras, duas medidas e dois pesos.
Sejamos gente e povo. Tenhamos sempre essa nobreza, que é o que nos dá força e razão de exercê-la. Se os supremos juízes são coniventes e abafadores, fora com eles. Há alturas em que se a Justiça não funciona pelos seus órgãos próprios tem que funcionar por outros. Todos os que se pronunciam contra a presença de gente que protesta nas ruas e acham isso anti-democrático, não são democratas. A acção cívica é um direito e um dever. O tirano global não pode ser deixado a exercer a sua infinita mediocridade, e a sua tentativa de controle de tudo e todos impunemente. Estamos na rua para dizer sem temor o teu precioso nome: Liberdade!

2010-01-29

Fialho o ex-boticário


«Esta residência entre drogas estragou-me a saúde e além de outros achaques de espírito e de corpo, incutiu-me uma tendência mórbida para as letras.» E continua: «Gastei sete anos a percorrer todos os lugares-comuns dos escritores nacionais, de 1830 para cá e a matar o tédio desta leitura com romances de cadernetas, e pequenos ensaios literários de fábrica própria para jornais de província, onde a petulância das minhas asneiras me acarretou, por Leiria e Viseu, foros de escritorinho esperançoso. Minavam-me o tédio e uma ânsia de liberdade insaciável, e alcancei que me deixassem ir findar os preparatórios do liceu, findos os quais, ao matricular-me na Escola Politécnica, o falecimento de meu pai me obrigou a abandonar botica e estudos, para ir acudir ao bem estar dos meus, ameaçado terrivelmente por aquela morte que nos deixara às portas da miséria. Por lá estive um ano inteiro, e tornado no ano seguinte, por aí fora vim vindo, té terminar o curso médico. Como vivi todo este tempo? Dos recursos do pouco que minha pobre mãe podia dar-me, de alguma colaboração avulsa por dicionários e pequenas folhas literárias, e enfim de lições que fui dando à hora em que os meus condiscípulos folgavam, descuidados, felizes, bem comidos, bem vestidos, ignorando o martírio do pão ganho aos patacos, e os prodígios de energia heróica, consumida a vencer economias de cigarros e de ceias, e a desaparecer enfim de toda a parte onde o ‘sucesso tem praça’, e poderia ser notado o nosso casaco velho, o nosso cabelo crescido e as nossas botas roídas nos tacões. Vencidos os cursos científicos, em vez de seguir, como os meus condiscípulos, nas facilidades profissionais que eles fomentavam, cometi a tolice de me lançar numa vida literária, de querer viver por uma pena donde continuamente espirravam revoltas, e que fatalmente havia de me agravar as dificuldades do caminho.»3

Fialho de Almeida

Filé de Fialho





«Deus fez o homem à sua imagem e semelhança, e fez o crítico à semelhança do gato. Ao crítico deu ele, como ao gato, a graça ondulosa e o assopro, o ronrom e a garra, a língua espinhosa e a câlinerie. Fê-lo nervoso e ágil, reflectido e preguiçoso; artista até ao requinte, sarcasta até à tortura, e para os amigos bom rapaz, desconfiado para os indiferentes e terrível com agressores e adversários.» [...] Desde que o nosso tempo englobou os homens em três categorias de brutos, o burro, o cão e o gato – isto é, o animal de trabalho, o animal de ataque e o animal de humor e fantasia – porque não escolhermos nós o travesti do último? É o que se quadra mais ao nosso tipo, e aquele que melhor nos livrará da escravidão do asno, e das dentadas famintas do cachorro.»

Fialho de Almeida

MonoPortugal


«Em Portugal há só um homem – que é sempre o mesmo ou sob a forma de dândi, ou de padre, ou de amanuense, ou de capitão: é um homem indeciso, débil, sentimental, bondoso, palrador, deixa-te ir; sem mola de carácter ou de inteligência, que resista contra as circunstâncias. É o homem que eu pinto – sob os seus costumes diversos, casaca ou batina. É o português verdadeiro. É o português que tem feito este Portugal que vemos.»

Fialho de Almeida

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2010-01-01

REPÚBLICA FANTASMA QUE TEMOS


Politicamente sou agnóstico, mas parece-me que a República foi a doença senil da Monarquia.

Sabe-se como os fantasmas representam bem - melhor do que os vivos - a realidade.
Neste momento o fantasma da III República agoniza. Mas os fantasmas às vezes demoram séculos a morrer.

Seja como for é divertido assistir ao circo do samsara.

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2009-12-12

EPITÁFIO DA IGREJA CATÓLICA


D. Manuel Clemente, Bispo do Porto, ganha o Prémio Pessoa.


Eis o que Pessoa, pela voz de um seu heterónimo pensava da Igreja Católica:

Charles Robert Anon

EPITAPH OF THE CATHOLIC CHURCH

EPITAPH OF THE CATHOLIC CHURCH

Friends, tread in peace, here lies the devil;

The world hath now but little evil.



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2009-12-10

Vendem-se Ladrões, já a ladrar e tudo



Um pouco de Cèline para desenferrujar a verrina:

Pequenos Ladrões

É preciso que a loucura dos massacres seja extraordinariamente imperiosa para se disporem a perdoar o roubo de uma lata de conserva! - que digo eu? - a esquecer! É bem verdade que não estamos habituados a admirar todos os dias uma imensidão de bandidos com opulência que o mundo inteiro, tal como nós, venera, e cuja existência, desde que a examinemos um pouco mais de perto, se revela um longo crime todos os dias renovado; mas essas pessoas desfrutam de glória, honras e poder, as suas perversidades são consagradas pelas leis, ao passo que, tão longe quanto pode levar-nos a História, tudo nos demonstra que um furto venial e sobretudo de alimentos mesquinhos como côdeas, presunto ou queijo, atrai infalivamente sobre o seu autor o opróbio formal, os repúdios categóricos da comunidade, as penas máximas, a desonra automática e a vergonha sem expiação, e isto por duas razões: em primeiro lugar porque o autor de tais perversidades em geral é pobre e em si próprio este estado implica uma indignidade capital, e em seguida porque o seu acto comporta uma espécie de censura tácita à comunidade. O roubo do pobre faz-se uma maliciosa recuperação do poder individual, está a compreender... Aonde iríamos parar? Por isso, repare bem, a repressão dos delitos insignificantes é exercida em todos os climas e com rigor extremo, não só como meio de defesa social mas também, e acima de tudo, como aviso severo a todos os infelizes para continuarem no seu lugar e na sua casta, mansos, resignadamente satisfeitos por morrer ao longo dos séculos, e indefinidademente, de miséria e fome... No entanto, aos pequenos ladrões até agora restava uma vantagem na República, ficarem privados da honra de usar as armas patrióticas.
[...]
Digo-vos, simplórios, vencidos da vida, escorraçados, espoliados, transpirados de sempre, previno-vos: quando os grandes deste mundo resolvem amar-vos é porque vão transformar-vos em carne para canhão... É o sinal... É infalível. É por amizade que a coisa começa. Luís XIV, esse, que nos lembremos marimbava-se por completo para o bom povo. Quanto a Luís XV, é a mesma coisa. Estava-se a cagar. Não se vivia bem nesse tempo, é certo, os pobres nunca viveram bem mas ao estripá-los não havia a teimosia e a obstinação que encontramos nos tiranos dos nossos dias. Para os pequenos, digo-lhe eu, só há descanso com o desprezo dos grandes que apenas podem pensar no povo por interesse ou sadismo... Foram os filósofos, repare ainda a propósito, que começaram por contar histórias ao bom povo. A ele, que só conhecia o catecismo! Empenharam-se, proclamaram eles, em educá-lo... Ah! Que verdades tinham a revelar-lhes! E das boas! E das fresquinhas! Que brilhavam! De se ficar embasbacado! É isto!, começou a dizer o bom povo, é isto mesmo! É precisamente isto! Vamos morrer todos por isto! Nunca quer mais do que morrer, o povo! Tal e qual. «Viva Diderot!», berraram eles, e depois: «Bravo, Voltaire!» Ao menos eram filósofos! E viva tmbém Carnot, que organiza tão bem as vitórias! E viva toda a gente! Ao menos eram gajos que não deixavam o povo morrer na ignorância e no feiticismos! Mostraram-lhe, eles, os caminhos da Liberdade! Emanciparam-no! Mas não durou! Primeiro saibam ler todos os jornais! É a salvação! Caramba! E isso rápido! Basta de analfabetos! Não pode havê-los! Apenas soldados-cidadãos! Que votem! Que leiam! E que se batam! E que marchem! E mandem beijos! Sob este regime, o bom povo acabou por chegar ao ponto certo. O entusiasmo de ter sido libertado não havia de servir para alguma coisa? Danton não era eloquente por tão pouco. Com alguns berros tão sentidos que ainda hoje se ouvem, do pé para a mão mobilizou o bom povo! Foi o ponto de partida dos primeiro batalhões de emancipados frenéticos! Dos primeiros pobres-diabos votantes e baindeirófilos que levariam Dumouriez a fazer-se esburacar na Flandres! Para o próprio Dumouriez que, chegando demasiado tarde a este pequeno jogo idealista inteiramente inédito, e acima de tudo interessado em carcanhóis, desertou. Foi o nosso último mercenário... O soldado gratuito era novidade... Uma novidade tal que Goethe, tão Goethe como era, ao chegar a Valmy ficou pasmado. Perante aqueles magotes esfarrapados e apaixonados que se davam espontanteamente a estripar pelo Rei da Prússia para defesa da inédita ficção patriótica, Goethe sentiu que ainda tinha muitas coisas a aprender. «A partir de hoje», proclamou tão magnificamente como seria de esperar do seu génio, «começa uma nova época!» Tal e qual! Em seguida, como o sistema era excelente puseram-se a fabricar heróis em série e cada vez menos caros devido ao aperfeiçoamenteo do sistema. Toda a gentes se deu bem. Bismarck, os dois Napoleões, e tanto Barrès como a Cavaleira Elsa. A religião bandeirista substituiu prontamente a celeste, velha nuvem já emurchecida pela Reforma e desde há muito condensada em pés-de-meia episcopais. Antigamente, a moda fanática era «Viva Jesus! Fogueira com os heréticos!» Raros e voluntários, porém, os heréticos... Ao passo que, de futuro, aqui onde nos vêem é com hordas imensas que os gritos: «Morte aos que não matam uma mosca! Aos pãezinhos sem sal! Aos inocentes leitores! Milhões de homens de face voltada ao perigo!», despertam vocações. Os homens que não quiserem assassinar nem deitar as mãos a ninguém, os mal cheirosos pacifistas, agarrem-nos e chacinem-nos! Que os trucidem de mil maneiras e feitios bem desarrincados! Para aprenderem, comecem por arrancar-lhes as tripas do corpo e os olhos das órbitas, e acabem-lhes com os anos de vida porca e abjecta que eles têm! Que os façam finar-se legião por legião, saltar na corda bamba, sangrar, fumegar em ácidos, e tudo para a Pártia vir a ser mais amada, mas alegre e amena! E se lá houver imundos que recusem compreender estas coisas sublimes, só há que fazê-los enterrar imediatamente junto dos outros, não digo isto à letra, claro, mas no fim do cemitério e com o desonroso epitáfio de cobardes sem ideal uma vez que perderam, estes ignóbeis, não só o mágnifico direito a um cantinho de sombra no monumento adjudicatário e comunal erigido aos mortos como deve ser, na álea central, mas também o direito de captar um pouco do eco do ministro que, nesse mesmo domingo, vai urinar à casa do prefeito e depois do almoço fazer uma berratina sobre as campas...

in Viagem ao Fim da Noite, Louis Ferdinand Cèline

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A DIVINA EXCARNAÇÃO II

Os CÉUs DOs ALENTEJOs

(The Sun Moves freedom, a Liberdade Move o Sol)

um demónio, digo eu,
um demónio azul do céu
fez este céu de três claros sóis
e um anjo inspirado pela imensidão
traçou - tão delicados! - os círculos
da divina e preciosa solidão

só mais tarde veio o lobo
rente à tarde das papoulas
em chamas. Narina de fogo frio
olhos de neve trocista
o lobo! foi ele quem fez a cal
dos montes

e enforcado em sílabas o poeta
desenhou o vermelho rubro do fim
dos horizontes. depois, vieram
todos os que não conheciam o número
e que bom que era o silêncio antigo

ah deitar-se depois do inferno
das figueiras com a moça
que era os trigais e a água!
e provar a rir as ameixas
da discórdia e da harmonia
com a pele tisnada de beijos!

então subíamos ao sete-estrelo
nós, pela voz das sibilas,
e movíamos erva nas estrelas
e a rosa negra dos mundos
e sabíamos. oh como
que deus é desejo

e o mundo está sempre a cair
estupefacto
como um fruto

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